ABCIC EM AÇÃO 2
A industrialização pode contribuir para o enfrentamento de três desafios vivenciados pela construção civil no Brasil: incremento de produtividade, escassez de mão de obra e neutralidade de carbono. Para mostrar a importância de ampliar o uso de sistemas construtivos industrializados em obras de todo o país, especialmente, em empreendimentos imobiliários de elevada altura, a Abcic promoveu o 8º Seminário Internacional, com o tema “A Industrialização da Construção em Concreto – Tecnologias e Soluções Sustentáveis para Verticalização”, no dia 16 de outubro, em São Paulo.
A engenheira Íria Doniak, presidente executiva da Abcic, afirmou que a industrialização tem ganhado cada vez mais relevância no contexto nacional, mas passou a ser vital diante desses desafios. “Por isso, a necessidade de se utilizar os sistemas construtivos industrializados, quer seja no conceito de ciclo aberto, em combinação com outros sistemas construtivos ou em soluções totalmente construídas com o pré-fabricado de concreto”, explicou.
Na abertura do evento, Íria reiterou a importância do trabalho realizado pela Abcic ao longo dos mais de 20 anos, como a criação do Selo de Excelência Abcic, as Missões Técnicas e o esforço para se ter uma normalização específica do setor, que possibilitou a promoção da 8º edição do Seminário Internacional e do lançamento das duas publicações: a versão em português do Boletim 101 da fib“Precast Concrete in Tall Buildings”, e o livro “Coletânea de Obras Brasileiras – Edifícios Altos Pré-Fabricados de Concreto”.
O presidente do SindusCon-SP, Yorki Estefan, destacou a importância da industrialização diante dos atuais desafios do setor, e a necessidade de se ter um alinhamento das três esferas de poder. Nesse sentido, ele citou como exemplo a restrição do uso de gruas, em São Paulo, que pode ser uma barreira para os sistemas construtivos industrializados. “Isso precisa mudar, por isso é fundamental um corpo técnico aderente à industrialização”, pontuou. Para Estefan, a reforma tributária pode trazer ganhos para a industrialização.
Outro ponto tratado por ele foi o esforço da construção civil para aumentar a mão de obra no setor, por meio do lançamento de um programa voltado para que estudantes do ensino médio possam conhecer o setor, compartilhando conhecimento para um futuro ingresso em uma das carreiras oferecidas na área, e a ação para capacitação de mulheres no canteiro de obras. “Hoje, na construção, somente 26% das pessoas têm carteira assinada. É um número impactante”.
Durante a solenidade de abertura, Felipe Cassol, presidente do Conselho Estratégico, e João Carlos Leonardi, vice-presidente do Conselho Estratégico e coordenador do Grupo de Trabalho (GT) de Edifícios Altos, ressaltaram que o evento trata de um tema fundamental para a construção civil, além de consolidar o planejamento estratégico da entidade, do qual um dos pilares estratégicos são os edifícios altos pré-fabricados de concreto.
“É um dos eventos mais importantes da história da Abcic. Estamos tratando do tema edifícios altos e lançando essas publicações, que são importantes para se atuar frente aos desafios atuais, como a falta de mão de obra na construção e a busca pela neutralidade de carbono. É um marco importante para a engenharia nacional”, ressaltou Cassol, que acrescentou ainda que o Seminário também consolida o planejamento estratégico da Abcic.
Leonardi trouxe informações sobre o trabalho realizado pelo GT de Edifícios Altos, cuja primeira reunião foi realizada em outubro de 2023, com o objetivo de alinhar as expectativas. “Foi neste dia que surgiu a ideia de editarmos o Coletânea de Obras Brasileiras sobre Edifícios Altos e definimos como meta a publicação até o final deste ano. Agora, se inicia uma nova etapa e vamos continuar atuando para disseminar o conhecimento e colaborar para que os edifícios com o sistema construtivo se tornem cada vez mais comuns nos canteiros de obras em um futuro próximo”, salientou.
Na sequência, o engenheiro espanhol David Fernández-Ordóñez, secretário-geral da International Federation for Structural Concrete (fib), mostrou diversas soluções aplicadas em países de todo o mundo, que estão retratadas no Boletim 101 da fib“Precast Concrete in Tall Buildings”, publicação redigida no âmbito da Comissão 6 de Pré-Fabricação, em cooperação com Precast/Prestressed Concrete Institute (PCI). Ele ressaltou ainda a importante participação do grupo brasileiro na fib. “O Brasil é extremamente relevante pela engenharia que possui. Vocês utilizam o que há de melhor em tecnologia”, comentou.
Atualmente, o grupo nacional brasileiro é liderado pelo engenheiro Fernando Stucchi, enquanto Marcelo Melo é presidente do Young Members Group (YMG) da fib. O Conselho Diretor (fibPresidium) é liderado por Steve Foster. “A próxima presidente será a engenheira Íria Doniak e será um momento importante para a associação, pois será a primeira mulher e representante da América do Sul a liderar nossa entidade. É uma conquista da engenharia mundial, especialmente do Brasil”, reforçou Ordóñez, que relembrou o envolvimento de Íria ao longo de vários anos na fib, contribuindo e compartilhando informações e conhecimento. (vide matéria Internacional na página 92)
Segundo Ordóñez, o primeiro desafio para a elaboração do Boletim 101 foi trazer uma visão mais clara sobre o que seria um edifício alto, já que essa métrica apresenta muitas variáveis, de acordo com cada país. Mas, foi definido o parâmetro de ser acima de 14 pavimentos, mas mesmo assim, esse número não é fixo, podendo se levar em conta outras questões como o uso de grua, os efeitos das forças do vento, esbeltez, entre outros. Antes dessa publicação, a entidade havia lançado outro relatório que definia a altura acima de 73 metros como parâmetro para edifícios altos.
O Boletim 101 começa descrevendo como a pré-fabricação pode ser usada em edifício altos. “São diferentes possiblidades para o sistema, incluindo as estruturas híbridas, combinando diferentes soluções construtivas”, ponderou Ordóñez.
Para alturas intermediárias, ele comentou sobre o uso de estruturas metálicas em parte da Europa e no Brasil, mas no norte europeu se constrói com painéis e paredes estruturais. “Não podemos esquecer da cultura de construção de cada país, por isso é importante utilizar ideias que estão sendo aplicadas e utilizá-las de acordo com os interesses locais”, avaliou. Em sua opinião, o sistema construtivo escolhido precisa atender o projeto arquitetônico e o de engenharia estrutural, o que significa que nem sempre será apenas utilizado o pré-fabricado de concreto.
“Temos alguns exemplos no boletim 101 com a aplicação de painéis de concreto, paredes, sistemas tubulares com o núcleo rígido com painéis que apoiam cargas, de paredes de cisalhamento com mais de 100 metros”, citou Ordóñez, cuja apresentação contemplou outras possibilidades de aplicação do sistema construtivo, como em paredes de cisalhamento, com core que atua com laje e estrutura intermediária, ou core concretado no local, capturando a força horizontal, com colunas mais esbeltas. Tratou de elementos de concreto para a instalação, pois com o uso do pré-fabricado de concreto, inserir esses elementos agilizaria o processo e, ao utilizar o BIM, a construção ganha ainda mais valor.
No norte da Europa, as sacadas são importantes, e a pré-fabricação é fundamental, pois não é fácil aplicar sacadas feitas in-loco. “Em países mais frios, o isolamento interno e externo já são incorporados. A produção em fábrica e montagem no canteiro se tornam muito interessantes. Tanto os gabaritos de testes como as conexões funcionam”, informou Ordóñez.
Em sua apresentação, abordou ainda os concretos de alta resistência para fabricação de elementos verticais, a utilização de gruas para ganhar tempo na construção, a importância do projeto e a combinação de sistemas construtivos para solucionar desafios. Também trouxe informações sobre as escadas pré-fabricadas de concreto, que são utilizadas na Europa, e o desenvolvimento de tecnologias de conexões. “As ferramentas estão à disposição para serem usadas”, pontuou.
De acordo com Ordóñez, é fundamental o trabalho em conjunto das indústrias de pré-fabricados de concreto e as construtoras, a fim de otimizar o processo construtivo. Na Espanha, as empresas criaram diversas soluções, como pórticos, para atender qualquer tipo de altura, sendo montadas com gruas. Entre as obras citadas por ele estiveram o Bella Sky (capa da primeira edição da Revista Industrializar em Concreto) e o North Galaxy (obra descrita em publicações da Abcic, como o Anuário e a Revista Industrializar em Concreto).