PONTO DE VISTA

O engenheiro civil Newton José Soares Cavalieri é diretor Titular do Departamento da Indústria da Construção e Mineração (DECONCIC) e vice-presidente do Conselho Superior da Construção (CONSIC), da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP). Atua ainda como membro da Diretoria do Sindicato da Construção Pesada do Estado de São Paulo (SINICESP), delegado representante do Sindicato na FIESP, membro do Conselho Fiscal da FIESP e, desde 2023, membro do Conselho Deliberativo da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).
Formado em Engenheira Civil pela Faculdade de Engenharia da FAAP, em 1972, e Extensão em Administração de Empresas pelo CEAG da FGV em, 1979, foi participante do 42ª Edição do Curso para Conselheiros de Administração do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – IBGC em 2013. Nas décadas de 1970 e 1980, trabalhou na Camargo Corrêa, liderando diversas obras de infraestrutura (metrô, rodovias, barragens, usinas hidrelétricas) e outros projetos.
Em 1990, juntamente com seu pai, fundou a Enejota Cavalieri Engenharia, empresa especializada na modelagem e na estruturação de projetos de concessão e de parcerias público-privadas (PPP). Nos últimos dez anos, tem atuado como uma empresa de engenharia independente, realizando auditorias de contratos de concessão, validando investimentos em CAPEX com recursos de bancos de fomento, e assessoramento ao agente fiduciário em operações de emissão de Debêntures Incentivadas, em diversos contratos de concessão de serviços públicos.
Em entrevista à Revista Industrializar em Concreto, Cavalieri faz uma avaliação do mercado da construção, dos caminhos para seu desenvolvimento e dos desafios a serem superados para o crescimento do setor no país. Também ressalta a importância e o trabalho realizado pelo DECONCIC/FIESP para a evolução contínua do segmento e comenta sobre a sustentabilidade, a digitalização e a industrialização da construção. “A industrialização desempenha um papel importante na transformação dos processos construtivos. Ela está diretamente ligada à inovação tecnológica, ajuda a enfrentar a escassez de mão de obra e contribui para reduzir o impacto ambiental das obras.”
A seguir, estão os principais pontos abordados por ele:
Poderia comentar sobre sua experiência no setor da construção civil?
Iniciei minha carreira na construção como estagiário de engenharia, realizando o acompanhamento técnico e a evolução de obras do SFH (Sistema Financeiro da Habitação). Na época, na década de 1970, era o maior e mais importante sistema financeiro para habitação popular. Minha primeira obra como engenheiro foi a construção do Metro de São Paulo, na Linha Norte-Sul (linha 1 - Azul). Fui chefe do canteiro das obras da Estação São Bento, a mais profunda desta linha, um verdadeiro trabalho de engenharia, para conciliar a vida agitada do centro da cidade de São Paulo (Largo São Bento) com o movimento de grandes guindastes, caminhões e outros equipamentos.
O método construtivo da escavação da Estação empregou paredes diafragma de 1,00 metro de espessura, sistema totalmente inédito no Brasil naquela época, o que impunha uma perfeita conciliação ente o transporte do material escavado para o bota-fora com o suprimento de concreto (auto adensável), produzido por uma central de concreto montada no próprio canteiro da obra, vizinha ao Mosteiro de São Bento e ao importante centro financeiro de São Paulo.
Outro método igualmente inédito no Brasil para a época foi a escavação de túneis com TBM (Tunnel Boring Machine), sendo usadas 2 máquinas Calweld (americanas) e 2 BADE (alemãs). Inicialmente, para o revestimento dos túneis, utilizavam-se anéis metálicos segmentados, com cerca de 1,5 metros de “extensão”, os quais, após montados, eram injetados com argamassa com aditivo de pega-rápida para impermeabilização do túnel. É difícil de imaginar a logística, para não dizer o custo de importar estes anéis metálicos, e manuseá-los de forma a serem transportados por via marítima da Alemanha até o porto de Santos, e daí até o canteiro das obras dos túneis no centro da cidade de São Paulo.
Engenheiros chamados para simplificar a logística de suprimento de anéis desenvolveram um anel de concreto fabricado em segmentos, à semelhança dos anéis metálicos, mas com a grande vantagem de ser produzido em um pátio de fabricação de pré-moldados de concreto, convenientemente próximo ao local de aplicação. Some-se a isto o menor custo dos anéis de concreto em comparação com os metálicos importados.
O resultado do desenvolvimento do anel de concreto, atendendo às normas técnicas vigentes, e as melhorias relativas à moldagem e à facilidade de manuseio tornaram possível aplicar essa solução já na construção da Linha 1 do Metro de São Paulo, antecipando sua entrada em operação.
Nos anos seguintes da minha trajetória profissional, tive a oportunidade de participar de alguns dos maiores empreendimentos de infraestrutura do Brasil. Entre eles, destaco a construção do trecho de serra da Rodovia dos Imigrantes, um conjunto notável de túneis e viadutos. No Lote 9, participei da execução do Viaduto VA-20, o mais alto da pista ascendente. Assim como os demais, o VA-20 possui superestrutura em vigas pré-moldadas de concreto, sistema construtivo que proporciona importantes vantagens em termos de qualidade, rapidez e racionalização da obra.
Com a experiência adquirida nessas grandes obras na região Sudeste, fui posteriormente designado para integrar a equipe responsável pela construção da Usina Hidrelétrica de Tucuruí, no Pará — um verdadeiro marco da engenharia brasileira. Esse projeto representou um enorme desafio técnico e logístico, cujas soluções inovadoras contribuíram de forma decisiva para o cumprimento dos prazos, o controle de custos e a excelência da obra.
Como exemplo de atualidade, cito a solução adotada para a cobertura da Casa de Força, o coração da Usina Hidrelétrica, feita com telhas pré-fabricadas de concreto protendido de grande dimensão, chamadas telhas W, o que resultou na aceleração do ciclo de fabricação, garantindo a qualidade e a proteção do sistema gerador da Usina.
Décadas se passaram e me direcionaram à constituição de uma equipe multidisciplinar de engenheiros, economistas e advogados, que se dedicaram a estudar e colocar em prática os processos que levavam ao sucesso os mais importantes projetos de concessão de rodovias para a iniciativa privada. Outros projetos na área de mobilidade e, principalmente, de saneamento básico, passaram a fazer parte da agenda permanente do Escritório de Engenharia que constituímos na década de 1990 e permanece até estes dias.